Esse assunto apesar de delicado é mais comum do que se imagina. Ocorre cotidianamente em alguns lares ou mesmo em empresas e, quem já viveu em uma relação abusiva, sente-se envergonhado, menosprezado, tem sua estima afetada e não supera o trauma sozinho rapidamente.

Senti-me motivado a escrever esse artigo, devido a um caso recente, vivido por uma ex-coachee, pessoa de minha estima e que tenho acompanhado. Meu objetivo é ajudar outras pessoas que estejam vivendo em um cenário semelhante.

Relacionamento abusivo: A relação abusiva pode ocorrer no âmbito pessoal ou profissional. Caracteriza-se pelo uso do poder excessivo de uma pessoa sobre a outra, através de ações, atitudes e formas de comunicação verbal ou não, que constrange, humilha e limita o outro em sua existência e dignidade.

Inúmeras pessoas vivem um relacionamento abusivo em algum contexto e desconhecem tal realidade, em função da crença: uma relação é abusiva apenas quando há uso de violência física ou verbal. Não necessariamente. Pode acontecer em qualquer tipo de relacionamento: amoroso, familiar, amizade ou mesmo profissional, desde que ocorra: manipulação, intimidação, humilhação, abuso de poder, violência verbal/ psicológica ou restrição à liberdade de expressão, é considerado comportamento abusivo.

Relacionamento abusivo no trabalho: Vivemos uma realidade caótica em nosso mercado de trabalho, face à crise política e econômica em nossos pais, com 13,4 milhões de desempregados -(Março/2019), em todos os níveis e segmentos, segundo o IBGE.

O cenário, ainda demissionário, favorece as empresas em função da lei da oferta (pouca) e procura (muita). Isso faz com que alguns profissionais que buscam recolocação se submetam a um rebaixamento salarial de até 25%, nos níveis de média e alta gerencia, para conseguirem trabalhar. Para os que estão empregados, tornam-se mais comuns as queixas de falta de propósito, reconhecimento, desmotivação e o aumento do relacionamento abusivo de alguns chefes, sob a justificativa da busca por resultados em tempos difíceis.

Popularmente conhecido como assédio moral, trata-se de um ato pontual ou recorrente praticado por alguns que exercem poder sobre outros. Comumente observado em algumas relações entre chefe e subordinado.

A relação abusiva pode ocorrer tanto em público como em particular. São situações onde o colaborador é constrangido de alguma forma em seu ambiente de trabalho. Seja ele, exposto e ridicularizado na frente dos seus colegas ou humilhado e coagido a ceder aos mandos do chefe em particular. Pode ser uma simples bronca imotivada e desproporcional, bullying ou uma ação coercitiva motivada, visando obter o “controle” sobre o outro, ou qualquer tipo de situação que cause constrangimento para o colaborador.

Caso constate a qualquer tempo, que trabalha em um ambiente em que você se sente constantemente frustrado, constrangido, ameaçado em diversas situações, seja emocional ou fisicamente, fique alerta, pois são evidências claras de um ambiente tóxico e propício as relações abusivas.

Lembrando que assédio moral é considerado crime no Brasil desde 2001, prevendo até dois anos de prisão para quem o pratica.

Comportamentos de um chefe abusivo:

Ø Não te passa nenhuma tarefa, sem explicar/ justificar a razão;

Ø Passa instruções erradas visando prejudica-lo profissionalmente;

Ø O responsabiliza por tudo, mesmo por erros inexistentes ou imaginários;

Ø O expõe fazendo críticas ou “brincadeiras” invasivas e de gosto duvidoso em público;

Ø Faz com que você trabalhe além do horário normal sem uma justificativa profissional;

Ø Muda você de sala para isola-lo/ castiga-lo ou o coloca junto com outras pessoas de outra área;

Ø Cria boatos a seu respeito;

Ø Aconselha -“Proíbe” - seus colegas de falar ou almoçar com você;

Ø Retira ou realoca seus instrumentos de trabalho (mesa, telefone, notebook, veículo da empresa), sem justificativa, para gerar constrangimento;

Ø Promove humilhação em público ou privado;

Ø Promove coerção ou ameaça demiti-lo em privado;

Ø Pune sem motivo, injustamente e às vezes de forma ilegal;

Ø O persegue como pode, visando forçar sua demissão.

É fundamental diferenciar o assédio moral de algumas práticas da empresa para controlar erros de processo ou desvio de conduta corporativa. Empresas possuem meios legais de punição, como a advertência ou até a demissão por justa causa. São práticas formais e que o colaborador tem direito a defesa, caso seja punido injustamente em seu entendimento.

Lidando com chefe abusivo: Em uma relação abusiva, não são poucos os efeitos nocivos causados ao abusado, caso não aprenda a lidar com a situação a seu favor. Para tanto é necessário manter seu emocional forte, equilibrado, para sobreviver ao ambiente tóxico e principalmente, estar focado em si ao invés do outro. Atente para o detalhe: você sofrerá muito mais numa situação abusiva, quando agir/ reagir predominantemente pela emoção, (perder a cabeça), pois você se contaminará, devido a funcionar como uma esponja que absorve tudo que vem em sua direção, sem critério. Vez que esteja mais centrado, cônscio de quem você é, de seus valores e limites, terá uma melhor condição para refletir sobre o cenário e agir racionalmente, compreendendo as intenções de ataque ou retaliação de seu chefe e agirá filtrando toda essa carga, minimizando o impacto sobre você e neutralizando seu chefe.

É imperativo, ainda que seja desafiador nessa situação, que você descanse e durma bem, alimente-se adequadamente, centre-se e busque reequilibrar-se para manter o controle da situação a seu favor.

Alguns escolhem o “fácil”, negam a realidade vivenciada, seu incômodo e efeitos nocivos, seguem em frente, acreditando ser apenas uma fase ruim e passageira. É importante identificar os sentimentos vividos nessa relação (desmotivação, incompetência, impotência, raiva), compreender a origem de cada um deles e extravasa-los consciente e adequadamente. Se necessário, busque ajuda de um Psicólogo.

Profissionais que sobrevivem a chefes abusivos possuem boa capacidade de manterem-se motivados e focados em si.  Não renunciam aos seus propósitos e valores e encontram a aprovação e prazer em seus próprios resultados, apesar do que acontece em sua área.

Lembre-se: FOCO – é tudo aquilo (situações ou pessoas) em que você coloca atenção, tempo, energia e atribui importância e que, vai crescer, te dominar e determinar seu futuro, seja isso positivo ou negativo para você. A escolha é sempre sua!

Existem formas para não se envenenar em situações abusivas advindas do estresse provocado por chefes tóxicos. As possibilidades reacionais visam estrategicamente tirar seu chefe do “surto” e neutraliza-lo através de questionamentos positivos voltados a solução racional do problema.

Seu chefe teve uma reação nervosa por algo que você tenha feito: Não reaja, não diga nada, respire e espere. Ele não ouvirá, pois está fora de controle. Quando ele se acalmar, crie a oportunidade para abordá-lo e diga algo como: Você pode me ajudar a entender como eu posso fazer isso melhor? Ao oferecer ajuda e pedir dicas sobre como melhorar sua contribuição, mostrará que está se colocando como parte da solução, não do problema e sendo resiliente.

Seu chefe xingou você: Atente ao descontrole dele e não reaja. Perceba que os seus próprios sentimentos momentâneos: raiva, impotência e tristeza, poderão comprometer seu raciocínio. Respire fundo e, aguarde os ânimos esfriarem e peça a ele para conversarem a sós, quando oportuno. Expresse seu respeito e os aspectos positivos da interação de vocês. Diga como se sentiu claramente ao ser xingado e algo como: Não consigo ser a minha melhor versão quando você age dessa forma comigo. Não diga apenas que se sentiu ofendido, não resolverá! É preciso deixar claro que você não produzirá bem caso ele continue te tratando de forma imprópria e não profissional.

Seu chefe criticou destrutivamente o seu trabalho: Busque fatos evidentes de que a sua entrega foi ruim ou errada. Sendo comprovado, seja humilde, reconheça o ocorrido e ofereça-se para refazer. É importante também avaliar o que há de valor na crítica e alinhar com o chefe. Diga algo como: Sinto dificuldade e gostaria de sua ajuda para meu aprimoramento ou obter dicas de uma pessoa sênior no assunto. Evite mais desgaste e desconsidere a forma destrutiva da crítica recebida e, não confronte seu chefe, assim demonstrará resiliência, que não se ofende facilmente e comprometimento em aperfeiçoar suas entregas.

Seu chefe é desconfiado: Acredita e exerce um estilo de gestão apertado e controlador, aquele que quer ser copiado em todos os e-mails. Diga algo como: O que você precisa ou quer saber diariamente? Ofereça-se para mantê-lo atualizado sobre o desenvolvimento dos trabalhos. Estabeleça um acordo e evite cobranças repetitivas.

Seu chefe é autoritário: Aquele que odeia ser contrariado ou corrigido. Reúna evidências sobre ideias contrárias às dele e diga algo como: Pesquisei e encontrei informações que podem agregar no processo de tomada de decisão. Apresente fatos divergentes como potenciais e complementares, isso eliminará a sensação de competição pela razão ou pelo argumento correto. Assim, ele sentirá que permanece no controle e você é aquele que apenas fornece os subsídios necessários.

Seu chefe é workaholic: Viciado em trabalho, fica irritado com os diferentes valores atribuídos ao trabalho e os ritmos atitudinais das pessoas qual, interpreta como não comprometimento. Demonstre interesse pelas ideias que ele apresenta para rebaixar sua ansiedade. Caso ele exagere nas cobranças, diga algo como: Atualmente meus esforços estão direcionados em cinco projetos. Por favor, me diga qual deles eu devo priorizar? Dessa forma, você traz foco para si e para o seu chefe, de maneira sutil, para que ele entenda que não há como fazer tudo concomitantemente.

Seu chefe comporta-se como um tirano (rude, autoritário, centralizador, exigente): Essa é uma situação limite e você já deve ter tentado outras formas de buscar entendimento, sem sucesso. Já percebe ou sente que está comprometendo sua saúde e pensa seriamente em demitir-se. Resta fazer uma última tentativa ousada, se julgar que ainda vale a pena. Diga algo como: Trabalhamos juntos há anos e percebo nossa relação desgastada. Você está interessado em lidar com esse desafio junto comigo? Tenha em mente que vai desafiá-lo, mas também, oferecerá ajuda para construírem uma relação melhor e mais produtiva. Questionar seu chefe a esse ponto é uma atitude arriscada, que requer muita coragem e segurança do seu valor e permanência na empresa/ equipe, mas que pode mudar sua vida para melhor, seja ainda na empresa ou mesmo fora dela.

Alternativas para lidar com um chefe abusivo:

Ø Imponha limites: Posicione-se, deixe claro ao seu superior que não aceita sua atitude ou comportamento abusivo;

Ø Obtenha provas: Não é algo simples nem fácil, mas uma troca de e-mails já ajuda. Você pode também gravar o assédio com o celular, caso consiga;

Ø Comunique o RH: Empresas médias e grandes possuem área de Recursos Humanos que aceitam denúncias anônimas;

Ø Denuncie: É possível fazer uma denúncia ao seu Sindicato ou ao Ministério Público, se necessário;

Ø Entre com um processo: Caso nenhum das formas anteriores resolva, você pode entrar na Justiça para solucionar o problema.

Não é simples enfrentar esta situação, tão pouco tomar uma atitude, mas é preciso tomar consciência de que você não é o culpado e quem está errado é o abusador. Alguns naturalmente sentem medo de perder o emprego, por denunciar, mas se colocar em uma situação aviltante como essa, pode desencadear efeitos colaterais muito mais graves em sua vida. Pense nisso!

Se você identificou-se com o artigo, por viver ou ter vivido tal realidade e, precise de ajuda profissional para orientação ou aprender a mudar sua visão, crenças e atitudes, para lidar assertivamente nessas situações, entre em contato: mccoach@uol.com.br

Marcio Caldellas – Psicólogo clínico, Personal, Career & Executive Coach certificado pela Sociedade Brasileira de Coaching e BCI – Behavioral Coaching Institute – USA. Sólida carreira desenvolvida em Executive Search como Headhunter atuando com posições executivas. www.mccoaching.net