Rastreabilidade de Medicamentos ou Serviços Cartoriais?
Anvisa realiza audiência pública sobre Rastreabilidade de Medicamentos e sugere mudanças em relação a RDC 54/2013.
A proposta de regulação da Anvisa para a rastreabilidade de medicamentos foi apresentada em 07 de dezembro de 2016 em audiência pública. O texto em discussão antecipa as mudanças que devem ser feitas na lei atual por meio do Projeto de Lei (PL) 4069/2015, que já foi aprovado de forma terminativa na Câmara dos Deputados e pode ir para sanção presidencial no início do próximo ano.
Inicialmente vamos contextualizar o tema rastreabilidade, para que serve, seus benefícios e as legislações anteriores
Definições:
- A rastreabilidade é definida pela Organização Internacional para a Normalização (ISO 8402:1994) como “a habilidade de rastrear a história ou a localização de uma entidade através de identificação registrada”.
- Rastrear é reconhecer determinado item, sua origem e as alterações de custódia a que ele foi submetido por meio de uma identificação única, seja ela numérica ou gráfica.
- Para rastrear é necessário conhecer a trilha, ou seja, identificar o bem (produto) através do caminho.
RDC 54/2013
- Art. 2º As empresas titulares de registro, fabricantes ou importadoras, têm a responsabilidade de garantir e zelar pela manutenção da qualidade, segurança e eficácia dos produtos até o consumidor final, a fim de evitar riscos e efeitos adversos à saúde, bem como de adotar os mecanismos e procedimentos objeto desta norma.
- Parágrafo único. A responsabilidade solidária de zelar pela qualidade, segurança e eficácia dos produtos, bem como pelo consumo racional inclui os demais agentes que atuam desde a produção até o consumo.
Para que serve/benefícios:
No âmbito da rastreabilidade de medicamentos o principal beneficiário deve ser o consumidor, com garantia de origem do medicamento e assim estabelecendo confiança no consumo de medicamentos. A serialização e rastreabilidade adequada de medicamentos, pode ajudar no combate à falsificação e o consumo de medicamentos roubados desde que haja imput de dados on line nos sistemas de registro e armazenamento de dados.
Considerando os tópicos descritos na apresentação divulgada no portal da Anvisa e os tópicos citados anteriormente, observamos que há algumas inconsistências, sob a ótica da rastreabilidade.
A proposta de alteração da RDC 54/2013, considera que não haveria necessidade de inclusão da data efetiva da ocorrência do evento, mas simplesmente a data do registro e ainda assim estabelece prazos para o envio do registro a partir da sua ocorrência, ou seja a indústria teria 3 dias para o registro o evento, 5 dias para o distribuidor e 7 para o varejista.
Considerando que os eventos de check in e ckeck out são os mais comuns em uma cadeia logística e que a rastreabilidade é pautada pelo registro da troca de custódia de forma cronológica, para que possamos traçar a rota do medicamento, conforme o exemplo abaixo (Tracking and Tracing – T&T)
A Anvisa propõe registrar os eventos sem a data da sua efetiva ocorrência e com prazos para o registro tão longo que inviabiliza o T&T.
Vejamos como iria se comportar o processo, de acordo com a proposta da Anvisa e considerando que cada elo da cadeia obedecesse ao seu próprio critério, mas respeitando a proposta e enviando a Anvisa somente a data de registro.
No processo exemplificado acima o consumidor já teria usado o medicamento e este ainda não teria sido registrado no processo de rastreabilidade.
Considerando que a que os fabricantes ou importadoras, têm a responsabilidade de garantir e zelar pela manutenção da qualidade, segurança e eficácia dos produtos até o consumidor final, a fim de evitar riscos e efeitos adversos à saúde, bem como de adotar os mecanismos e procedimentos objeto desta norma.
A comunicação dos eventos, conforme a proposta da Anvisa, não garante os objetivos do SNCM, tais como:
- Ferramenta útil contra a falsificação e o roubo de carga;
- Otimiza a ação de emissão de alertas e favorece a retirada eficiente, rápida e segura de produtos do mercado;
- Aumenta a segurança do paciente, reduzindo o risco do consumo de produto ilícito (contribui para reduzir custos do sistema de saúde);
- Permite a sistematização de dados de farmacovigilância e a formulação de ações específicas;
Visando a correta aderência ao processo de rastreabilidade e sempre em benefício do principal elo da cadeia, o consumidor, todos os processos de registro de eventos devem ser combinados com a efetiva data da ocorrência do evento e este devem ser realizados de forma cronológica e on line.
Vale ressaltar que as operações fiscais da cadeia logística, já ocorrem de forma cronológica e on line e devem ocorrer em paralelo aos processos de rastreabilidade.
Para que serve os grandes investimentos que a indústria, distribuidores e varejistas, fizeram ou ainda farão para se adequarem ao Sistema Nacional de Medicamentos / Rastreabilidade de Medicamentos se este processo for simplesmente cartorário e não retornar com benefícios ao consumidor?
Precisamos sempre retornar aos princípios da rastreabilidade, ou seja, dar ao consumidor a garantia de origem do medicamento e condições que este não consuma medicamentos falso ou produto originário de roubo, desde que haja input de dados on line nos sistemas de registro e armazenamento de dados.
Autor: Luiz Antonio Gomes Correia
Engenheiro Químico, pós-graduado em Engenharia de Segurança do Trabalho e especializações em Gestão de Projetos e Supply Chain/Logística, com mais de 30 anos de experiência em Industria Farmacêutica, Alimentícia, Operador Logístico e Empresa de Tecnologia, tendo atuado em diversas áreas como Qualidade, Produção, Supply Chain, Logística, Comercial e Gestão de Projetos.