Por Marc Tawil

Graças ao barulho provocado nas redes sociais, Jair da Silva, que distribuía cartões de visita nos semáforos de SP comemora a volta ao mercado após escolher entre 10 propostas de emprego

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O roteiro não é de cinema, mas bem que poderia ser:

No Brasil mergulhado na maior crise econômica de sua história contemporânea, um professor universitário de 61 anos, desempregado há cinco meses, cria um cartão de visitas único e, de terno, vai às ruas pedir uma oportunidade de trabalho aos motoristas parados nos semáforos da agitada São Paulo. Contrariando todos os prognósticos, em apenas um mês, recebe 10 propostas de emprego e, exatamente 30 dias depois da entrega dos primeiros 250 cartões, recomeça como gerente-geral de uma empresa do setor de saúde.  

Paulistano, casado, um filho já adulto, Jair da Silva estava na batalha pela recolocação havia cinco meses, quando teve um insight: em vez de disparar centenas de currículos, pagar para empresas especializadas ou correr atrás de contatos que mal lhe respondiam, por que não pedir uma oportunidade direto para quem decide, sem intermediários?

A ideia não era nova. A grande sacada foi “como”Jair a colocou em prática.

Ex-encarregado de setor no Grupo Pão de Açúcar, ex-coordenador de Ensino na Fundação Armando Alvares Penteado (Faap) e ex-analista de Implantação e Processos no Banco Panamericano, com mais de 20 anos de experiência no Ensino Superior, Jair investiu R$ 39,00 para criar 1.000 cartões como este:

E escolheu o Largo da Batata, em Pinheiros, para fazer valer o investimento. Minha mulher, Elisa, foi uma das 250 pessoas que receberam o cartão em 29 de agosto – único dia em que Jair saiu para a rua.

Contei essa história aqui no Pulse, em forma de reportagem, depois de entrar em contato com o Jair: Quem é o professor universitário que distribui este cartão nos semáforos de SP.

A história sobre a atitude inovadora dele viralizou. Foi matéria exclusiva noCatraca LivreNa TV RecordNo HypenessE na BBC Brasil – onde a reportagem escrita por José Paulo Lanyi foi a mais lida do portal, compartilhada milhares de vezes no Facebook, e também no G1UOLFolha de S. Paulo e dezenas de outras homepages web afora.

O turbilhão provocado pelo Pulse culminou, palavras do Jair, com sua recolocação – o novo diretor dele leu sua história na BBC Brasil.

Duas semanas depois, após milhões de visualizações, de curtidas, milhares de compartilhamentos e comentários, volto a entrevistar (o agora gerente-geral) Jair da Silva. E, de novo, me surpreendo com seu foco e generosidade.

O que mais te tocou nesses dias todos de repercussão?
Ser ajudado por pessoas que nunca vi. Foi gratificante e emocionante.

E o saldo da distribuição de cartões?
Recebi 10 propostas de trabalho: professor, representação escolar, clínica em em Alphaville, empresa de óculos de segurança, vendedor, proposta de novos negócios e projetos, consultor... Foram centenas de e-mails, mensagens de WhatsApp, ligações no celular, telefone fixo, e milhares de comentários em redes sociais e portais onde a reportagem foi veiculada, como no LinkedIn.

Alguém te procurou dizendo que estava fazendo cartões?
Sim, e deu muito certo. Teve a Noélle (foto), uma engenheira de Produção gaúcha que mora no Rio de Janeiro. Fez algo parecido e, em menos de 20 dias, estava empregada como gerente de planejamento em uma empresa da Barra da Tijuca, especializada em e-commerce. Há outras pessoas que pediram pelo site onde eu fiz os cartões e até um professor de Portugal que leu a reportagem no Pulse e diz que vai utilizar a minha técnica. Espero que dê certo para todos.

Como aconteceu a convocação para o emprego?
O diretor da empresa comentou que viu a reportagem no site da BBC Brasil e enviou um e-mail para uma entrevista, na data de 29.09.2016 – exatamente um mês após a entrega do 1º cartão. Deu tudo certo na primeira reunião.

O que você ouviu dele?
Que a empresa quer crescer. Respondi que vou fazer de tudo pra que a empresa cresça muito mesmo, vou valorizar cada centavo que ele me pagar.

Quando soube que estava contatado, qual foi a sua reação?
Felicidade por ser valorizado, peito cheio de alegria, emoção.

E a reação da sua família?
Choro, alegria, felicidade…Todos estão contentes, todos agradecem a Deus, nunca desanimaram, sempre tiveram a certeza que eu iria conseguir.

Imagino que nesses seis meses tentando uma recolocação tenha havido passagens amargas...
O que me deixou triste, no começo, foi a falta de solidariedade daqueles que dizem ser amigos, irmãos, parentes, mas não respondem nada, não dão a mínima satisfação, não usam da solidariedade para com aqueles que estão na pior, no fundo do poço. É muito melhor e mais digno dizer um “não”, “não posso” e “não vou fazer”. As pessoas têm que aprender a dizer “não”. É melhor ouvir uma negativa do que ficar na esperança, na expectativa, na ilusão de que algo vai acontecer. Tenha a dignidade de responder a quem lhe pediu ajuda. 

O que você tem a dizer àqueles que leram sua história e que permanecem na luta pela recolocação?
Nunca, jamais desistam. Tenham fé em Deus, foco, rezem todos os dias, acreditem em vocês, vão à luta, tenho certeza que a sua perseverança vai dar frutos. E, para as empresas, o recado é: revejam seus conceitos e contratem pessoas seniores. Elas vêm com muita garra, bagagem profissional, são excelentes executivos e ainda têm muito a oferecer, muita lenha para queimar.

Se você tiver de voltar para a rua, retomará os cartões?
Espero não voltar, mas se tiver de fazê-lo, farei outro cartão, diferente.

O Jair que tantos inspirou pretende fazer o que com essa exposição?
Vou trabalhar. Jamais pensei que haveria tanta mídia envolvida, mas não quero repercussão, propaganda. Já atingi meu objetivo, e caso eu possa ajudar outras pessoas assim o farei. Não tenho planos para levantar bandeiras e me engajar apenas por me engajar, muito menos entrar na política. Daqui a 10 anos, só espero falar o que fiz neste tempo. Muito obrigado a todos.

Obrigado a você e boa sorte, Jair!

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Marc Tawil

Jornalista, radialista e escritor. Pertenceu às redações do jornal Resenha Judaica, Rádio Jovem Pan AM, Jornal da Tarde (Grupo Estado) e Rádio BandNews FM. Publicou os livros Trânsito Assassino (Ed. Terceiro Nome), Haja Saco, o Livro (Ed. Multifoco) e editou a biografia do advogado Abrão Lowenthal (Ed. Quest). Tem MBA em Gestão Empresarial pela FGV e cursa MBA de Marketing pela USP. Dirige a Tawil Comunicação.