Mais da metade dos hospitais que tratam câncer no Rio não contam com exames básicos

Seção: SAÚDE
Categoria: Hospital
Publicado em 17/03/2017
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Dez dos 19 hospitais públicos e conveniados ao SUS que atendem pacientes com câncer no estado do Rio não contam com exames básicos necessários ao tratamento. Desses, quatro não têm sequer uma unidade de referência para realizar essas avaliações, fundamentais para guiar o médico na decisão pela melhor conduta. Os que conseguem os exames aguardam em média quatro semanas pelos resultados. Os dados estão num levantamento realizado pelo Conselho Regional de Medicina (Cremerj), entre outubro e novembro do ano passado. Traduzem em números a catástrofe em que se transformou o atendimento oncológico no Rio. Esse cenário vem sendo mostrado, desde a última terça-feira, na série de reportagens “Um Estado terminal”.

— É uma situação gravíssima, porque a regulação não funciona. Encontramos hospitais com serviço de oncologia que não têm condições de fazer avaliações imunológicas, renais. Apenas dois hospitais fazem imuno-histoquímico. Os laudos demoram 11 semanas. Fora o tempo que o paciente já perdeu para fazer todos os exames de diagnóstico, ser encaminhado para um hospital... Se ele sobreviver, é um Highlander — diz o coordenador da pesquisa, o diretor do Cremerj Gil Simões.

Eliana Barbosa, de 51 anos, viu um ano e três meses passarem entre o momento em que notou um nódulo na mama e o início da quimioterapia no Instituto Nacional de Câncer (Inca). Sentia-se aliviada por estar num centro de referência:

— Mas precisei fazer uma cintilografia óssea para ver se havia metástase, e o equipamento estava quebrado. Fiz por fora, paguei. Isso foi em 2015. Agora, meu sogro passou pelo mesmo problema no Hospital Federal de Bonsucesso. Depois de esperar seis meses em vão, pagamos pelo exame, dividindo em parcelas no cartão.

Analista de departamento pessoal, Eliana abandonou o tratamento no Inca desde que sua doença agravou e foi constatada metástase óssea.

— O médico disse com todas as letras que não teria mais nada a me oferecer pelo SUS. Hoje, eu me trato pelo plano de saúde e recebo medicações avançadas. Estou bem, cuidando dos meus filhos. Já meu sogro, também com metástase óssea, está definhando no Hospital Federal de Bonsucesso. É revoltante. É triste ver que o paciente que depende do SUS só sobrevive se tiver sorte.

 

 

Perde-se tempo. E vidas.

A oncologista Sabrina Rossi Chagas, professora de pós-graduação em mastologia na PUC-Rio, deixou o Inca em 2015.

— Quando entrei, as discussões clínicas eram para debates de casos. Quando estava perto de sair, passaram a ser para decidirmos quem iria receber o remédio ou não. Não somos deuses para decidir quem vai viver ou não — revolta-se a médica, que escreveu o livro “Como estamos? O desafio do câncer de mama”, relatando sua experiência durante a luta do pai contra a doença.

Hoje, Sabrina atende no Hospital dos Servidores do Estado pela manhã e, à tarde, na rede privada.

— Tenho mais de 15 anos de experiência em oncologia, atendendo na rede pública. Nunca esteve tão ruim. Pela primeira vez, as vagas para novos pacientes chegaram a fechar por um período no Servidores. Às vezes, não tenho os exames de que preciso para decidir e trocamos o tratamento meio às cegas. Não é ideal para o médico nem para o paciente. Essa não é a medicina que gostaríamos de oferecer. É desestimulante.

Após 14 anos no Inca, o oncologista Gilberto Amorim decidiu deixar o serviço público e, hoje, atende apenas na rede privada.

— O paciente espera meses por um exame. É uma tortura. Tem que ter estômago. Não tenho mais. O câncer é uma doença difícil. Mas não se perde tanto paciente na rede privada como na pública. Isso é inaceitável.

Amorim explica que, para iniciar qualquer tratamento oncológico, é imprescindível que se tenha o laudo do exame histopatológico. A pesquisa do Cremerj mostrou que o tempo médio para o resultado dessa análise é de quatro semanas.

— O paciente demora de dois a três meses até conseguir apresentar esse laudo ao médico — diz Amorim.

Quanto aos exames de imuno-histoquímico, realizados apenas em dois dos 19 hospitais avaliados, o tempo médio de espera pelo resultado é de 11 semanas, quase três meses.

— Sem imuno-histoquímico, não se consegue sequer iniciar o tratamento de determinados cânceres, como o de mama, de pulmão e linfoma.

O Ministério da Saúde afirma que os seis hospitais federais no Rio ampliaram de 10% a 25% o atendimento oncológico (consultas e quimioterapia) de 2015 para 2016. Em nota, informou que, “além de oferecer serviços do SUS em seus seis hospitais e três institutos federais no Rio de Janeiro, o Ministério da Saúde repassou em 2016 para o atendimento de média e alta complexidade (que engloba hospitalizações e tratamentos de câncer, por exemplo) os valores de R$ 3,99 bilhões ao estado, o responsável por esse tipo de serviço, e mais R$ 3,09 bilhões ao município, o gestor pleno da Saúde no Rio”.

Confira a nota do Ministério da Saúde na íntegra:

Os seis hospitais do Ministério da Saúde no Rio de Janeiro ampliaram de 10% até 25% o atendimento a pacientes oncológicos (consultas e sessões de quimioterapia) de 2015 para 2016 e estão completando nesta semana o trabalho de redefinição do perfil assistencial e cirúrgico para ampliar ainda mais os serviços de tratamento do câncer, uma demanda crescente entre a população do estado.

Os hospitais federais de Bonsucesso, Andaraí, Cardoso Fontes, Ipanema, Lagoa e dos Servidores do Estado realizaram 90.355 atendimentos oncológicos em 2016, 10,8 mil a mais do que no ano anterior, além dos atendimentos a pacientes com câncer nas emergências. O caso mais complexo é o do Hospital Federal de Bonsucesso (HFB), no qual, em média, 40% dos pacientes que dão entrada na emergência são pessoas com diagnóstico ou suspeita de câncer e já chegam ali em estágio avançado da doença.

Pela localização, com acesso fácil pela Avenida Brasil, a população da Zona Norte do Rio de Janeiro e da Baixada Fluminense tem recorrido de forma mais intensa ao HFB quando não encontra atendimento em outras unidades. Em média, 60% dos pacientes na emergência são provenientes de outras cidades. Devido ao aumento da procura de pacientes, o Instituto Nacional de Câncer (Inca), unidade do Ministério da Saúde integrada à rede de hospitais, passou a receber nas últimas semanas pessoas em tratamento quimioterápico no HFB. A medida emergencial visa desafogar o serviço aos pacientes oncológicos.

Além de oferecer serviços do SUS em seus seis hospitais e três institutos federais no Rio de Janeiro, o Ministério da Saúde repassou em 2016 para o atendimento de média e alta complexidade (que engloba hospitalizações e tratamentos de câncer, por exemplo) os valores de R$ 3,99 bilhões ao estado, o responsável por esse tipo de serviço, e mais R$ 3,09 bilhões ao município, o gestor pleno da Saúde no Rio.

Fonte: http://extra.globo.com/noticias/rio/mais-da-metade-dos-hospitais-que-tratam-cancer-no-rio-nao-contam-com-exames-basicos-21068641.html#ixzz4bZypwg2Y

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